O Congresso Nacional aprovou nesta quinta-feira (29) uma mudança significativa no processo de obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). A partir da sanção presidencial, será obrigatório o exame toxicológico para candidatos das categorias A e B, destinadas a condutores de motocicletas e automóveis. A medida faz parte do Projeto de Lei 3965/21, de autoria do deputado federal José Guimarães (PT-CE), e foi aprovada pela Câmara dos Deputados após ajustes feitos no Senado.
Exame será exigência para obter a CNH provisória
De acordo com o novo texto, o exame toxicológico de larga janela de detecção será pré-requisito para a concessão da CNH provisória, documento concedido a quem se habilita pela primeira vez. O teste será realizado em clínicas médicas credenciadas ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), da mesma forma que já ocorre para os motoristas das categorias C, D e E.
Os exames detectam o uso de substâncias psicoativas como maconha, cocaína, anfetaminas, opiáceos e outros entorpecentes que comprometem os reflexos e a capacidade cognitiva do condutor. A janela de detecção mínima é de 90 dias, o que permite identificar o consumo crônico, e os resultados são confidenciais.
Embora o resultado positivo impeça a concessão da CNH, não haverá penalidades legais para o candidato, apenas a inaptidão para conduzir veículos até que o exame aponte resultado negativo em uma nova tentativa.
Financiamento da CNH para pessoas de baixa renda
O projeto de lei também estabelece que os recursos arrecadados com multas de trânsito poderão ser utilizados para financiar a habilitação gratuita de pessoas de baixa renda, inscritas no Cadastro Único (CadÚnico) para programas sociais do governo federal. A proposta visa aumentar a inclusão no mercado de trabalho, especialmente em áreas como transporte de passageiros e entregas por aplicativo.
Além disso, os recursos continuarão sendo destinados a obras de infraestrutura e segurança no trânsito, como já previsto na legislação atual.
Transferência de veículos totalmente digital
Outra inovação aprovada pelo Congresso é a possibilidade de realizar a transferência de propriedade de veículos de forma 100% digital em todo o país. Contratos eletrônicos de compra e venda assinados com certificação digital terão validade jurídica plena e deverão ser aceitos por todos os Detrans do Brasil, eliminando burocracias e filas nos órgãos de trânsito.
Substâncias no trânsito: uma ameaça invisível e mortal
A aprovação do exame toxicológico para motoristas das categorias A e B ocorre em um contexto alarmante: o uso de álcool e drogas no trânsito está entre as principais causas de mortes nas estradas brasileiras.
De acordo com dados do Ministério da Saúde, mais de 30 mil pessoas morrem todos os anos em acidentes de trânsito no Brasil. Um levantamento da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet) revela que cerca de 21% dos acidentes fatais envolvem motoristas sob efeito de álcool ou substâncias psicoativas.
Estudos também apontam que motoristas alcoolizados ou drogados estão até dez vezes mais propensos a se envolverem em acidentes graves, especialmente durante a noite, fins de semana e feriados prolongados. O uso de anfetaminas, por exemplo, é comum entre caminhoneiros que buscam resistir ao cansaço, mas o efeito rebote compromete drasticamente os reflexos e a atenção.
No caso dos motociclistas — público diretamente afetado pela nova regra —, os números também preocupam. Segundo o DataSUS, os motociclistas representam mais de 30% das vítimas fatais em acidentes de trânsito, e muitos desses casos têm relação com consumo de álcool ou drogas.
Especialistas apoiam a medida
Para especialistas em segurança viária, a ampliação da exigência do exame toxicológico é um passo importante na redução da impunidade e na promoção de um trânsito mais seguro.
“Hoje, quem busca a primeira habilitação pode consumir drogas de forma crônica e ainda assim ser aprovado nos exames tradicionais. Isso é um risco absurdo. Com o toxicológico, conseguimos detectar padrões de uso e evitar que pessoas nessas condições assumam a direção”, explica o médico e perito em medicina do tráfego, Dr. Roberto Manzini.
A medida também é vista como uma forma de combater o subregistro do uso de drogas ao volante, já que atualmente muitos acidentes provocados por motoristas sob efeito de substâncias não são devidamente investigados ou registrados.
Próximos passos
Com a aprovação pelo Congresso, o texto segue agora para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem até 15 dias úteis para decidir se promulga ou veta o projeto, total ou parcialmente. Caso sancionada, a nova legislação poderá entrar em vigor já nos próximos meses, dependendo de regulamentação dos Detrans estaduais.
A expectativa é que, com a nova exigência e o reforço na fiscalização, o Brasil avance no combate à impunidade no trânsito e reduza os altos índices de mortes causadas por condutores sob influência de drogas e álcool.
Edição: Damata Lucas – Imagem: Freepik