Bebês reborn: afeto, terapia ou alerta para a saúde mental?

Com aparência incrivelmente realista, cheirinho de talco, cabelos implantados fio a fio e até certidão de nascimento, os bebês reborn têm conquistado corações em diferentes faixas etárias. Se antes eram vistos apenas como brinquedos sofisticados para crianças, hoje são considerados objetos de afeto, instrumentos terapêuticos e itens de colecionismo por adolescentes, adultos e idosos.

Entretanto, o crescente apego a essas bonecas hiper-realistas também tem levantado um importante debate: até que ponto esse vínculo é saudável?

Além do brinquedo: uma função emocional e simbólica

Segundo a psiquiatra Luana Dantas, coordenadora do Núcleo Infantojuvenil da Holiste Psiquiatria, os bebês reborn podem desempenhar uma função simbólica positiva em contextos específicos, como lares de idosos, clínicas de saúde mental ou no acompanhamento de mulheres que passaram por perdas gestacionais ou infertilidade.

“Elas ajudam a reorganizar o emocional de quem está enfrentando luto, solidão ou ansiedade. Podem servir como apoio transitório, oferecendo conforto simbólico em momentos de vulnerabilidade emocional”, afirma Luana.

O uso terapêutico das bonecas já é observado em intervenções com idosos com demência, por exemplo, onde o cuidado com o reborn pode acionar memórias afetivas e trazer sensação de acolhimento. Em outros casos, elas funcionam como ferramentas de mediação emocional, principalmente para pessoas com dificuldade de verbalizar sentimentos.


Quando o afeto se transforma em alerta

Apesar dos benefícios possíveis, o apego aos bebês reborn pode ultrapassar os limites do saudável, principalmente quando substitui os vínculos humanos e afeta a rotina ou o funcionamento social da pessoa.

“Se a boneca deixa de ser um objeto simbólico e passa a ocupar o lugar de uma relação real, impedindo que a pessoa lide com perdas, frustrações ou interaja com o mundo ao redor, isso pode ser um sinal de sofrimento psíquico”, alerta Luana.

Ela explica que o uso do lúdico por adultos é comum — como no caso dos videogames, hobbies, cosplay ou colecionismo — mas é necessário atenção ao nível de intensidade e impacto na vida real.


Sintomas que merecem atenção psicológica

Entre os principais sinais de alerta associados ao uso excessivo das bonecas reborn estão:

  • Isolamento social;
  • Sofrimento ao se separar da boneca;
  • Substituição de relações humanas reais por vínculos com o objeto;
  • Recusa em participar de atividades sociais;
  • Rotinas rigidamente centradas no cuidado com a boneca (como simular horários de alimentação, banho, sono etc.);
  • Quadros de ansiedade, depressão ou luto não elaborado.

“Há pessoas que alimentam uma fantasia intensa com o reborn, tratando-o como um bebê real em todos os aspectos. Se isso estiver acompanhado de sofrimento emocional evidente ou prejuízo funcional, é fundamental procurar acompanhamento especializado”, reforça a psiquiatra.


Família e amigos: como agir com acolhimento e cuidado

O envolvimento com bonecas reborn não deve ser automaticamente encarado como patologia. O ponto central é compreender a função que o objeto cumpre na vida da pessoa. Para familiares e amigos, o mais indicado é manter um olhar acolhedor, livre de julgamentos, mas atento aos sinais de sofrimento.

“Se a pessoa mantém uma rotina funcional, está emocionalmente estável e usa a boneca como forma de expressão ou passatempo, não há razão para preocupação. Mas se o uso passa a gerar angústia ou afastamento da realidade, o suporte psicológico é essencial”, pontua Luana.


Um fenômeno crescente e complexo

O universo dos bebês reborn revela como objetos podem ultrapassar sua função original e se tornar parte de processos subjetivos profundos. Ao mesmo tempo que acolhem, podem também evidenciar dores não resolvidas.

Por isso, o olhar sobre o fenômeno precisa ser humano, sensível e técnico — reconhecendo tanto os benefícios quanto os riscos, e buscando sempre o equilíbrio entre fantasia e realidade.

Edição: Damata Lucas – Imagem: Freepik

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