A Califórnia, o estado mais populoso e economicamente poderoso dos Estados Unidos, entrou com uma ação judicial contra a política tarifária do ex-presidente e atual ocupante da Casa Branca, Donald Trump. A medida, anunciada nesta quarta-feira, visa contestar a legalidade das tarifas impostas pelo republicano sem o aval do Congresso, num gesto que reacende o conflito entre o estado liderado por democratas e a administração federal.
“Trump não tem o poder unilateral de alterar radicalmente a paisagem econômica do país. Não é assim que a nossa democracia funciona”, declarou o procurador-geral da Califórnia, Rob Bonta, durante coletiva de imprensa em Sacramento. Ele reforçou que a Constituição dos EUA confere ao Congresso – e não ao presidente – o poder de regular o comércio internacional.
A disputa surge num momento em que o presidente Trump, que retornou ao poder em 2025, retoma sua política de protecionismo agressivo. Após prometer durante a campanha eleitoral restaurar empregos industriais e reduzir déficits comerciais, Trump voltou a impor tarifas pesadas sobre importações, atingindo principalmente produtos da China, Canadá, México e dezenas de outros países.
Atualmente, produtos chineses enfrentam tarifas de até 145%, enquanto certas mercadorias canadenses e mexicanas estão sujeitas a taxas de 25%. No início de abril, Trump surpreendeu ao anunciar tarifas adicionais de 10% sobre uma variedade de bens importados, apenas para suspendê-las dias depois, provocando confusão e instabilidade nos mercados globais.
“O Congresso não autorizou essas tarifas, muito menos permitiu que fossem aplicadas, revogadas e reintroduzidas de forma arbitrária”, criticou Bonta. A ação judicial argumenta que Trump está extrapolando sua autoridade ao se apoiar na Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional de 1977, que, segundo especialistas, não concede ao Executivo poderes ilimitados para impor tarifas.
A Califórnia, que concentra o setor tecnológico de ponta no Vale do Silício e lidera a produção agrícola dos EUA, depende intensamente de relações comerciais estáveis com parceiros como México, Canadá e China. O estado exporta bilhões de dólares em frutas, vegetais, nozes e dispositivos eletrônicos, tornando-se particularmente vulnerável às flutuações provocadas por guerras comerciais.
“Nenhum outro estado será tão impactado por essa instabilidade”, disse o governador democrata Gavin Newsom. “Isso é uma imprudência. Está a destruir a economia dos Estados Unidos”, continuou, ao acusar Trump de prejudicar os próprios eleitores que o levaram à vitória, especialmente agricultores do meio-oeste e estados rurais, diretamente afetados pelas retaliações estrangeiras às tarifas americanas.
Além disso, Newsom destacou o impacto negativo das tarifas sobre os mercados financeiros e sobre as poupanças para aposentadoria de milhões de norte-americanos. “O comportamento errático do presidente está corroendo o futuro das famílias que ele afirma proteger”, afirmou o governador, frequentemente citado como potencial candidato presidencial para 2028.
A disputa também evidencia um embate mais profundo entre a Califórnia e o governo federal. Esta é a 15ª ação judicial movida pelo estado desde o retorno de Trump ao poder, dando continuidade à tradição do primeiro mandato do republicano, quando a Califórnia apresentou mais de 120 ações contra sua administração, cobrindo temas que vão desde imigração até políticas ambientais.
Recentemente, o estado também se insurgiu contra decisões polêmicas da Casa Branca, como o suposto favorecimento a empresas privadas — incluindo cortes no orçamento federal concedidos a Elon Musk — e ameaças a regulamentações de proteção ambiental e de uso da terra.
Em resposta, um porta-voz da Casa Branca criticou a iniciativa californiana: “Em vez de focar no crime desenfreado, na crise dos sem-abrigo e no custo de vida fora de controle na Califórnia, Gavin Newsom prefere tentar sabotar os esforços históricos do presidente Trump para remediar a emergência nacional representada pelos déficits comerciais persistentes dos Estados Unidos”.
Especialistas em comércio e direito constitucional alertam que o caso poderá redefinir os limites do poder presidencial em matéria econômica. Se a Justiça acatar os argumentos da Califórnia, Trump poderá ser forçado a submeter suas políticas tarifárias ao crivo do Congresso, o que, com a atual maioria republicana, pode gerar divisões internas.
Enquanto isso, líderes de outros estados também observam de perto a movimentação californiana, com possibilidade de adesão à causa judicial. Para muitos analistas, a batalha jurídica poderá ter impactos duradouros não só na política comercial americana, mas também no equilíbrio de poderes entre os estados e o governo federal.
Edição: Damata Lucas – Imagem: Casa Branca