A partir desta terça-feira, 6 de maio, os cardeais da Igreja Católica Apostólica Romana entram em reclusão absoluta no Vaticano, dando início ao conclave — o processo formal e secreto para eleger um novo papa. Trata-se de um momento solene que mobiliza não apenas os 120 cardeais eleitores (menores de 80 anos) vindos de todo o mundo, mas também milhões de católicos ansiosos, em uma Igreja dividida entre forças reformistas e conservadoras.
O termo conclave vem do latim cum clave (“com chave”), porque os cardeais ficam literalmente trancados (clausi) sob sigilo, sem acesso ao mundo externo, até que seja alcançada a maioria de dois terços necessária para eleger o novo pontífice. A tradição remonta ao século XIII, quando o papa Gregório X institucionalizou o processo para evitar longos períodos de vacância papal.
Uma Igreja em disputa: reformas versus tradição
Este conclave é especialmente simbólico e tenso. Desde a renúncia de Bento XVI em 2013 — primeiro papa a abdicar em quase 600 anos — e a eleição de Francisco, a Igreja Católica vive um embate interno entre setores que defendem mudanças (como maior acolhimento de divorciados, homossexuais e mulheres) e setores conservadores que exigem a defesa firme das tradições, do catecismo e das normas morais históricas.
Francisco, primeiro papa latino-americano e jesuíta, buscou abrir portas para diálogos inéditos, ampliar a escuta de minorias e reforçar a ação pastoral em questões sociais como pobreza, migração e mudanças climáticas. Já os conservadores, especialmente da ala curial (ligada à burocracia interna do Vaticano), criticam essa abertura, temendo relativismo moral e perda de identidade católica.
Como funciona o conclave?
Os cardeais se reúnem na Capela Sistina, sob os afrescos monumentais de Michelangelo, onde realizam até quatro votações diárias. Cada voto é manual e secreto, registrado em cédulas que, ao final de cada rodada, são queimadas em uma estufa especial: a fumaça preta indica que não houve consenso; a fumaça branca anuncia ao mundo que um novo papa foi eleito.
Os eleitores prestam juramento de sigilo total, e todo contato externo (inclusive telefones celulares) é cortado. O isolamento visa garantir que a decisão seja tomada exclusivamente sob inspiração espiritual, sem pressões políticas ou midiáticas.
História do conclave: das intrigas às reformas
Historicamente, os conclaves já duraram meses — ou até anos —, quando facções internas não conseguiam acordo. Um dos episódios mais longos ocorreu em Viterbo (1268–1271), quando a população, exasperada, chegou a trancar os cardeais a pão e água e remover o teto do local para forçá-los a decidir.
As regras atuais foram progressivamente aperfeiçoadas ao longo dos séculos, especialmente para evitar interferências externas. Desde o século XX, os conclaves passaram a ser mais curtos e discretos, durando geralmente poucos dias.
Os nomes cotados e os desafios à frente
Veja os nomes cotados para suceder ao papa Francisco:
Jean-Marc Aveline, França
Péter Erdő, Hungria
Mario Grech, Malta
Juan Jose Omella, Espanha
Pietro Parolin, Itália
Luis Antonio Gokim Tagle, Filipinas
Joseph Tobin, Estados Unidos
Leonardo Ulrich Steiner, Brasil
Peter Turkson, Gana
Matteo Maria Zuppi, Itália
O novo pontífice enfrentará desafios complexos: queda no número de fiéis na Europa, expansão na África e Ásia, crises de credibilidade por abusos sexuais e escândalos financeiros, além das tensões geopolíticas, como guerras e migrações.
O olhar do mundo
À medida que os cardeais se recolhem no Vaticano, o mundo aguarda, atento, os sinais da fumaça: será que os ventos soprarão em direção a uma continuidade das reformas, ou haverá um freio conservador? O que está em jogo não é apenas o rosto do próximo líder espiritual de 1,3 bilhão de católicos, mas os rumos da Igreja em uma era de profundas transformações globais.
Edição: Clique PI – Imagem: Freepik