Crise entre Planalto e Câmara expõe impasse sobre controle fiscal e prioridades orçamentárias

Por Damata Lucas

A tensão entre o governo federal e a Câmara dos Deputados ganhou novos contornos com o embate em torno do IOF — Imposto sobre Operações Financeiras. O impasse se intensificou após o envio, por parte do Executivo, de uma medida provisória que mantém a cobrança do tributo sobre operações de câmbio, contrariando expectativas de parte do Congresso. A resposta veio rapidamente: parlamentares protocolaram um projeto de decreto legislativo para derrubar a medida, escancarando a crise institucional e orçamentária que paira sobre Brasília.

Mas afinal, o que está em jogo?

O IOF é um imposto federal que incide sobre diversas transações financeiras, como crédito, câmbio, seguros e operações de títulos e valores mobiliários. Embora tenha sido criado com um objetivo regulatório — ou seja, como instrumento de política monetária —, na prática tornou-se uma fonte relevante de arrecadação para o governo federal. Em tempos de aperto fiscal, como agora, abrir mão dessa receita não é simples.

Contudo, o desconforto no Legislativo não se resume à questão técnica. Parlamentares argumentam que o governo insiste em ampliar a carga tributária sem apresentar medidas concretas de corte de gastos. Esse argumento vem sendo ecoado por setores da imprensa econômica e por analistas do mercado financeiro. A crítica central: faltam sinais claros de comprometimento do Executivo com o equilíbrio fiscal.

Porém, esse discurso exige uma reflexão mais profunda — e, sobretudo, mais honesta.

As cobranças por cortes recaem, quase sempre, sobre áreas como saúde, educação e programas sociais como o Bolsa Família e o BPC (Benefício de Prestação Continuada), que atendem justamente à parcela mais vulnerável da população. A tentativa de equilibrar as contas públicas sacrificando o mínimo existencial previsto na Constituição levanta questões éticas e políticas relevantes. O ajuste fiscal não pode incidir apenas sobre quem mais precisa do Estado.

Enquanto isso, pouco se fala sobre os R$ 50 bilhões em emendas parlamentares incluídas no orçamento federal, grande parte delas com destinação pouco transparente. Esses recursos — que são, na prática, transferências do governo federal aos parlamentares — viraram moeda de troca política, ainda que à custa da previsibilidade fiscal. A resistência da própria Câmara em discutir cortes nesse montante revela um desequilíbrio no debate: cobra-se do Executivo uma disciplina que o Legislativo também deveria compartilhar.

A realidade é que a crise do IOF é apenas um sintoma de um problema maior: a ausência de um pacto institucional por responsabilidade fiscal com justiça social. O governo precisa, sim, apresentar medidas estruturais para conter gastos e melhorar a eficiência da máquina pública, mas não pode fazê-lo atacando os alicerces do Estado de Bem-Estar. Da mesma forma, o Parlamento precisa assumir seu papel no esforço de equilíbrio orçamentário — inclusive revendo privilégios e repensando o uso indiscriminado de emendas.

Mais do que uma disputa por protagonismo, o momento exige responsabilidade coletiva. E transparência. O ajuste virá, inevitavelmente. A pergunta é: quem vai pagar essa conta?

Imagem – IA

Notícias recentes

Notícias em alta

Com notícias do Piauí, do Brasil e do Mundo!

©2024- Todos os direitos reservados. Clique Pi