Roberto Marinho e a Globo na Ditadura: poder, mídia e silêncio em tempos de autoritarismo

Em um dos períodos mais sombrios da história recente do Brasil, marcado por censura, repressão e violência institucional, uma empresa de comunicação cresceu a ponto de se tornar a mais poderosa do país: a Rede Globo. A contradição é evidente, mas também reveladora dos complexos laços entre poder político e mídia no Brasil. Essa história ganha agora um novo capítulo com o lançamento do segundo volume da trilogia Roberto Marinho: A Globo na Ditadura – Dos Festivais às Bombas no Riocentro, do jornalista e historiador Leonencio Nossa, que chega às livrarias no dia 24 de abril pela editora Nova Fronteira.

O livro cobre o período que vai de 1967, quando foi criado o Jornal Nacional, até o atentado fracassado no Riocentro, em 1981 — um marco simbólico do início do fim da ditadura militar. Nesse intervalo, a figura de Roberto Marinho e o crescimento da Rede Globo se confundem com os rumos da política nacional. Leonencio, jornalista premiado e com vasta experiência em coberturas sobre direitos humanos e política, mergulha nos bastidores do maior grupo de comunicação do país e revela como ele se consolidou em meio ao autoritarismo, muitas vezes o legitimando, outras, se equilibrando entre mercado e censura.

Com pesquisa meticulosa baseada em documentos oficiais, acervos privados e dezenas de entrevistas, inclusive com a família Marinho e ex-colaboradores, Leonencio mostra que a ascensão da Globo não foi apenas um golpe de sorte ou de competência técnica. Foi também um projeto político, com alianças estratégicas e concessões — não apenas de canais, mas de narrativas. O livro aponta que, embora a empresa tenha sido moldada por um discurso de modernização e profissionalismo, ela também silenciou vozes, colaborou com a censura e se beneficiou do regime autoritário.

Mas o autor não cai na armadilha de simplificar seu personagem. Leonencio reconhece que a Globo também foi espaço de resistência, ainda que limitada, e palco de disputas internas entre jornalistas e militares. A ambiguidade da emissora e de seu fundador é um dos eixos centrais da obra: enquanto Roberto Marinho endossava o regime publicamente, internamente jornalistas tentavam driblar a censura e manter algum grau de liberdade editorial.

O livro não apenas reconstrói os passos de um dos homens mais poderosos da história da mídia brasileira, como também convida à reflexão sobre os limites éticos da comunicação em contextos de autoritarismo. O passado, como lembra Leonencio, ainda ecoa nas instituições e nas relações entre imprensa e poder. A leitura é, portanto, não apenas uma biografia, mas um convite à autocrítica de uma nação que ainda lida com os fantasmas do silêncio, da omissão e da manipulação.

Roberto Marinho: A Globo na Ditadura não é só sobre um empresário ou uma emissora. É sobre o Brasil. Um país que, muitas vezes, preferiu esquecer do que encarar seu passado de frente. E que ainda precisa decidir o que fazer com sua memória.

Edição: Damata Lucas – Imagem: Arquivo Pessoal

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